Em vermelho sangue, escuro e grosso.
O pulmão encarregou-se de o expelir, deixando a nú todas as fragilidades que não seriam imediatamente visíveis num corpo de um jovem adulto. A constante dor, de tão habitual que era, tinha-se diluído como sua parte integrante.
Suspirou tão fundo como lhe era permitido pela respiração artificial. Sentou-se na cama e olhou a maquinaria que o matava lentamente ao fazê-lo sobreviver.
Fechou os olhos. Viu a surpresa no rosto do homem que estava na estrada a olhar para a janela do primeiro andar, mesmo no momento em que lhe bateu com a moto. Não percebeu o que tinha acontecido. Aliás, o que percebeu era demasiado fantasioso para ser real. Só podia estar a dar em doido. Só podia. E por causa da sua insanidade, tinha morto um homem. À dor do físico, sobrepunha-se agora esse amargo revolto que lhe percorria o seu corpo, esse fel que fazia parte do seu sangue, escuro e grosso. Nunca iria viver em paz.
Abriu os olhos.
Procurou o tubo plástico que respirava por ele, atravessando a garganta.
Retirou-o e sufocou. Durante 3 minutos sofreu como achou que devia sofrer, o que era justo sofrer. Sentiu a dor no peito como nunca a tinha sentido antes, viva. Morreu de consciência pesada.
talvez por isso tenhas sido o fantasma da família. a tua presença sempre foi a mais forte dentro daquele casarão que ainda penso como nosso, apesar de nunca ter sido propriedade nossa. talvez me tenhas marcado por teres desperdiçado a tua vida agarrado um inútil sentimento de culpa, ou pela tua história só me ter sido contada aos bocados durante a minha vida. por já ter passado a tua idade e ainda sentir que és uma alma velha que perdura enquanto houver a tua memória, mesmo que nunca te tenha conhecido. talvez porque perceba o teu último suspiro e também precise de uma desculpa.
É uma certeza cá de dentro I've got a feeling e não a consigo esconder, nem quero a feeling I can't hide
Como quando...
vou em direcção ao teu copo pós laboral, quotidiano ano ano ano ano ano ano momento estival da narcótica habitude ude ude ude ude que escorrega a sua peçonha pelo troço arrastado do tempo .
Essa certeza ambulante,
mar ca da
mente
com
pa ssa da pe la
passa da dor
mente
com pe
ten
te
mente
.
Mas bonito, bonito, era deixarmo-nos de merdas e fazermo-nos à estrada. Deixar para trás os soluços das vidas que nos seguem, suspirar pelos próprios meios, respirar em pulmões alheios. abrir os olhos e segurar o volante, firme, bem firme, com a ponta dos dedos.
Respirar Why don't we do it in the road? Aflito grito de ressaca desse prazer, ofuscando os restantes (mundanos) pela sua própria ausência.
Ando farto de pintar paredes com palavras vazias de cheias intenções
Ando a arrastar tintas e baldes e frustrações
Com frases feitas de quem nunca viveu o nosso tempo
Escritas ao nível da rua onde tu passas sem nunca me leres
Para além dos símbolos que, unidos, têm um sentido
Que só eu conheço e nós um dia conhecemos
Já ando farto de fugir à polícia e de, entre soluços,
Justificar a um rural gendarme
Que a vida só existe quando te escrevo na rua
Palavras vazias que tu nunca lês
Borbulhas, fresca, por mim
Anseias pela minha boca quase tanto como eu anseio por te tocar com os lábios
Tornamo-nos um só...
Divertes-me com a tua acidez
RIo depois de te ver
Sorrio depois de te ter
Saboreio cada momento contigo
Fermento nobre
(Sexta-feira, noite de cerveja)
De forma disforme, entre dois dedos de conversa, olhei bem fundo para ti.
Aconteceu quando o Silêncio chegou e se sentou connosco à mesa. Tinha andado adormecido, desaparecido há umas horas e nem reparámos na sua ausência.
Mas quando acordou, talvez influenciado pelo divagar saltitante do diálogo, entusiasmou.se. E quanto mais seguíamos, bamboleando em ébrios devaneios de planos e histórias, mais o invejoso se chegava.
Senti que queria, à força, participar. O grande invejoso, queria fazer parte de nós.
Ignorei-o e olhei bem fundo para ti.
Sem querer, calámo-nos.
Era um Silêncio incómodo...
rengue rengue
rengue rengue
rengue rengue
rengue rengue
(mas qualquer dia farto-me e
catrapum
pra ti)
Absorto num atol de merda, vi a garrafa a boiar
ainda longe, o seu reflexo cegou-me
Os braços lançados ao ar, a vontade de saltar
daqui para fora, execrável salvação do naufrágio
A garrafa afastou-se e ainda me cegava.
Nadei na sua direcção, esquecendo-me
que não o sabia fazer.
O atol de merda riu-se de mim
enquanto me afogava alegremente.
Dos canais de distribuição de grandeza moral
às inúteis reservas de riqueza pelicular.
Há ideias internas que teimam em se materializar
Em parcos pecúnios da sua verdade
Das inúteis listagens de potenciais baleias
que legalizam o arpão com falinhas mansas
Faço troca ilícita de pensamentos em série
por peles esfoladas e unhas em sangue.
Engulo assim a agonia apertada entre a traqueia e o esófago,
transformo-o em quimo, metano e espalho-o
À vívida arrogância de quem o pode apreciar
como uma breve reminiscencia do seu primitivo lar.
com a liberdade condicionada à existência material
consagrada e diabolizada, deificada até ao banal
a corrente física do serviço tributário
analisou a vida como expediente ordinário
com obrigações a juros, assámos então as sardinhas
com o calor, o sufoco e a areia nas virilhas
pesada bola (de berlim), ainda presa à corrente
arrasta o iludido, doce, docemente
a centopeia do alcatrão dos estivais iludidos
continuou pelo serão sem nos dar ouvidos
de volta à toca, mundana e infeliz
com a pele quente neste africano trovejar
de quem nunca viu sequer uma tatuagem do ultramar
Porque é que um minuto demora os tais 60 movimentos do ponteiro mais pequeno? Não poderia passar em 59? ou em 30? o mesmo tempo não passaria de igual forma? e poderia o ponteiro dos minutos fazer um dos seus movimentos inteiro, sem falhar, mesmo que os 60 movimentos do segundo ponteiro que demoravam um minuto inteiro passassem a ser só 30 movimentos? Afinal quem tinha decidido que seriam precisos 60 segundos para fazer um minuto? Nunca tinha gostado que lhe tivessem imposto nada ...
E o tempo era uma das coisas que ele achava demasiado importante e precioso para que fosse dividido assim, como um bolo-rei de fatias iguais, principalmente por um desconhecido qualquer.. Não, o seu tempo não seria dividido por nenum pasteleiro. O seu tempo era só seu e iria vivê-lo como ele quisesse, saboreando as fatias irregulares e
talvez até engasgando-se no brinde. Tanto fazia, seria no seu tempo que isso aconteceria e não no tempo de mais ninguém. Naquele dia, matou as horas, os minutos e os segundos.
Naquele dia, o tempo morreu para o ourives.
As três souberam alimentar-me e tratar de mim. Uma vez estive doente. Tremeram-me as pernas quando me levantei da cama e só me lembro de ver o chão de madeira a vir contra mim a toda a velocidade. Acordei não sei quanto tempo depois, mas já devia ser noite. A hárpia já não tinha a farda de dia, mas a farda de noite, que era assim como que num tecido grosso mas era branco e estava com a cara de sempre, sem expressão. A minha cabeça doía-me imenso e tinha como que um cilindro de músculos e carne entre o nariz e o olho direito. Ela trazia um pano molhado na mão e quando se debruçou senti-lhe a teta no meu peito. Acho que foi a primeira erecção que tive e ela reparou e quase que juro que a vi esboçar um sorriso cúmplice. A partir desse acidente, de cada vez que que o corpo me obriga a espirrar, tenho dores no nariz. Mesmo assim não me consigo esquecer das suas tetas. Fantásticas hárpias que cuidavam de mim. Nunca me faltou nada.
. Manel
. Pichagem
. conversa
. do dia
. a lista
. 3-
. 2.
. 1.
. Manel
. Pichagem
. conversa
. do dia
. a lista
. 3-
. 2.
. 1.
. PORQUE A MÃE JÁ TEM CARA ...